STJ decide: comprador de imóvel alienado fiduciariamente não tem direito automático à propriedade
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a Súmula 308 da própria Corte não se aplica a situações em que o imóvel foi dado como garantia em alienação fiduciária. A decisão foi tomada pela 4ª Turma e reforça que não se pode estender uma exceção prevista em um contexto legal específico para outro com características jurídicas distintas.
O caso julgado envolveu uma construtora que, em busca de crédito para realizar um empreendimento, entregou como garantia fiduciária um apartamento e uma vaga de garagem a uma administradora de consórcios. No entanto, mesmo sem ser mais a proprietária legal dos imóveis, a empresa vendeu essas unidades por meio de um contrato de promessa de compra e venda. Mais tarde, os direitos foram repassados a dois compradores.
Quando os novos compradores descobriram que os imóveis tinham sido consolidados em nome da credora fiduciária, devido ao não pagamento da dívida pela construtora, entraram na Justiça para tentar reverter a situação.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ/RS) deu ganho de causa aos compradores, utilizando por analogia a Súmula 308 do STJ, que trata de casos envolvendo hipoteca em imóveis financiados pelo Sistema Financeiro da Habitação (SFH). Contudo, a decisão foi questionada e chegou ao STJ por meio de recurso da administradora de consórcios.
O ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do processo no STJ, destacou que a súmula foi criada em contexto totalmente diferente, relacionado à falência da construtora Encol, que afetou compradores de imóveis financiados pelo SFH. Nesse sistema, há regras específicas de proteção ao consumidor, o que não ocorre nos contratos com garantia de alienação fiduciária.
O ministro também explicou a diferença entre hipoteca e alienação fiduciária. No caso da hipoteca, o devedor continua sendo o proprietário legal do imóvel até a execução da dívida. Já na alienação fiduciária, o imóvel fica em nome do credor até que a dívida seja quitada. Portanto, quando o devedor fiduciante vende o imóvel sem autorização, ele está negociando algo que já não lhe pertence legalmente.
O STJ reafirmou que, nesse tipo de situação, mesmo que o comprador esteja de boa-fé, não há como garantir a ele a propriedade do imóvel. A negociação feita entre as partes terá validade apenas entre elas, sem afetar o direito do verdadeiro dono — no caso, o credor fiduciário.
Por fim, o ministro alertou que permitir a aplicação da Súmula 308 nesses casos poderia aumentar o risco dos contratos de crédito, o que prejudicaria os próprios consumidores com a alta dos juros. Para ele, a segurança jurídica é fundamental para garantir o acesso ao crédito e o equilíbrio nas relações contratuais.
Processo: REsp 2.130.141